sexta-feira, 17 de junho de 2011

Buenos Aires homenageia Jorge Luis Borges: 25 anos

Buenos Aires homenageou Jorge Luis Borges nesta terça-feira com a leitura de poemas e a interpretação de milongas do escritor argentino no dia em que se completam 25 anos de sua morte em Genebra, aos 86 anos.
O ato organizado pela Prefeitura da capital argentina foi a única grande homenagem realizada no país para Borges, cujo legado literário ocupou nesta terça-feira várias páginas dos principais jornais portenhos.
Na praça San Martín, no centro de Buenos Aires, atores e apresentadores leram vários poemas de Borges, enquanto o duo musical Baraj-Barrueco interpretou milongas escritas pelo autor de "O Aleph".
"Borges e sua obra estão indissoluvelmente ligados à nossa identidade portenha e não podíamos deixar de resgatar hoje parte de seu legado", ressaltou o ministro (secretário) da Cultura e Turismo da capital argentina, Hernán Lombardi.
A homenagem aconteceu junto à "Torre de Babel" de livros que no início de maio foi erguida na praça pela artista plástica Marta Minujín, em ocasião da nomeação de Buenos Aires como "Capital Mundial do Livro" 2011, pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
"Quando era muito menina fui visitar Borges na Biblioteca Nacional, porque para mim já era um ídolo. Depois criei a 'universidade do fracasso' - porque eu acho que o sucesso e o fracasso são a mesma coisa - e procurei-o de novo para que falasse sobre isso, e ele me disse: 'O fracasso não existe!'", relatou Minujín.
A artista pop disse que sempre teve com Borges "uma coincidência mental".
"O fato de nós dois sermos portenhos. Eu com a Torre de Babel e ele com seu conto 'A Biblioteca de Babel'. Além disso, ele analisava o tempo e eu faço minhas esculturas sobre o tempo relativo, então me parece que tenho muito a ver com ele", avaliou.
"Esta Torre de Babel não existe em nenhum lugar do mundo. Borges também não", acrescentou Minujín na homenagem

Fonte: Agencia EFE - 14/06/2011
Trecho do conto Aleph:

[...] O diâmetro do Aleph seria de dois ou três centímetros, mas o espaço cósmico estava aí, sem diminuição de tamanho. Cada coisa (o cristal do espelho, digamos) era infinitas coisas, porque eu a via claramente de todos os pontos do universo. Vi o populoso mar, vi a aurora e a tarde, vi as multidões da América, vi uma prateada teia de aranha no centro de uma negra pirâmide, vi um labirinto roto (era Londres), vi intermináveis olhos próximos perscrutando-me como num espelho, vi todos os espelhos do planeta e nenhum me refletiu, vi num pátio da rua Soler as mesmas lajotas que, há trinta anos, vi no vestíbulo de uma casa em Fray Bentos, vi cachos de uva, neve, tabaco, veios de metal, vapor de água, vi convexos desertos equatoriais e cada um de seus grãos de areia, vi em Inverness uma mulher que não esquecerei, vi a violenta cabeleira, o altivo corpo, vi um câncer no peito, vi um círculo de terra seca numa calçada onde antes existira uma árvore, vi uma chácara de Adrogué, um exemplar da primeira versão inglesa de Plínio, a de Philemon Holland, vi, ao mesmo tempo, cada letra de cada página (em pequeno, eu costumava maravilhar-me com o fato de que as letras de um livro fechado não se misturassem e se perdessem no decorrer da noite), vi a noite e o dia contemporâneo, vi um poente em Querétaro que parecia refletir a cor de uma rosa em Bengala, vi meu dormitório sem ninguém, vi num gabinete de Alkmaar um globo terrestre entre dois espelhos que o multiplicam indefinidamente, vi cavalos de crinas redemoinhadas numa praia do mar Cáspio, na aurora, vi a delicada ossatura de uma mão, vi os sobreviventes de uma batalha enviando cartões-postais, vi numa vitrina de Mirzapur um baralho espanhol, vi as sombras oblíquas de algumas samambaias no chão de uma estufa, vi tigres, êmbolos, bisões, marulhos e exércitos, vi todas as formigas que existem na terra, vi um astrolábio persa, vi numa gaveta da escrivaninha (e a letra me fez tremer) cartas obscenas, inacreditáveis, precisas, que Beatriz dirigira a Carlos Argentino, vi um adorado monumento em La Chacarita, vi a relíquia atroz do que deliciosamente fora Beatriz Viterbo, vi a circulação de meu escuro sangue, vi a engrenagem do amor e a modificação da morte, vi o Aleph, de todos os pontos, vi no Aleph a terra, e na terra outra vez o Aleph, e no Aleph a terra, vi meu rosto e minhas vísceras, vi teu rosto e senti vertigem e chorei, porque meus olhos haviam visto esse objeto secreto e conjetura) cujo nome usurpam os homens, mas que nenhum homem olhou: o inconcebível universo" [...].

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