terça-feira, 30 de abril de 2013

Conto selecionado no Edital 05/2013: "O mundo de Macbeth"

O mundo de Macbeth

por  Stefane Soares Pereira *

Dizem que a partir de uma era denominada moderna a humanidade passou a ter consciência das barbaridades que tencionaram na vida do outro. Retomaram as tragédias gregas e as esboçaram em arte, em beleza e encantamento. O saber humanista expandiu-se também para as leis e os bárbaros subiram ao palco grego e dançaram em alegria amistosa e aspiraram à liberdade.
E muita fé religiosa e não religiosa conspirou em corações ansiosos de esperança. E essa crença persistiu em meio a artigos e pronunciamentos políticos. Até que um dia pedi que as estrelas escondessem suas chamas, e que não deixasse sua luz irradiar em meus desejos sombrios e profundos.
Era eu o presidente da Comissão dos Direitos Humanos e da Cidadania. Eu que um dia me encontrava em meio a papeis e jornais e livros que a elite jogava fora. Eu que não tinha nada comecei a lê-los e imaginar que um dia eu também estaria no jornal, eu também faria diferença no mundo. Fiz vestibular e cheguei onde queria. Nunca senti medo da minha natureza. Alçar grandes voos era o meu destino.
Casei-me e estava feliz. Ganhava muito bem, trabalha três dias da semana e amava as férias na Europa. Mas não algo me dizia que mudanças deveriam acontecer. Como uma profecia as forças do mal já prediziam, desde minha infância, minha indignidade.
Com alta idade testava os sentimentos psicopatas abusando das garotinhas lindas que estavam da puberdade, assim como das mães das mães das mães e também dos garotinhos de classe média que amam voltar tarde para casa. Procura uma explicação freudiana para além do mal. Todavia, não encontrei. Então quando virei gente resolvi fingir que era uma pessoa comum. Até que me cansei.
E então quando eu atingi a agulha da torre eu resolvi expor todo o meu veneno. Ultrapassar constituições e afirmar meus ideais publicamente. Minha aversão aos negros, aos homossexuais e, claro, também as mulheres, embora eu as amasse como minhas servas. Sempre as escolhi para poder manipulá-las e afirmar minha masculinidade.
A humilhação me alimenta. Negar as férias dos empregados, o repouso, o lazer, colocar criança para trabalhar, se for escurinha então que sustento! Punir meu próprio filho porque ele espancou um pedinte? Jamais! Há pessoas que não tem direito à vida. A legislação faz essa imposição porque sabe que não funciona na prática. E quem fomenta o cumprimento desses direitos acaba perdendo, a vida.
O capitalismo se institui e permanece não porque as pessoas querem ser solidárias. Se o fossem seríamos comunistas! Por isso sou homem das leis, assim como muitos são homens da vida, os quais podem decidir o quanto de despesas a sociedade deve produzir e o quanto de lucro deve gerar para seus usufrutos.
A cobiça nos nutre e para isso devemos nos silenciar quando somos beneficiados, silenciar quando o outro é injustiçado e sorrir para todo o todo, afinal, cada um vive por si. Assim, cheguei ao auge, mas logo o mundo me mostrou que a soberania não me pertencia, ela não me é suprema; quando os pequenos me mostraram que mesmo agindo a meu favor ininterruptamente um dia eu mesmo encontraria o meu inferno dantesco. E antes desse artifício minha esposa me trapaceou, prendendo-me em uma ilha sombria, perseguidora e tenebrosa. 

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* Stefane Soares Pereira, vive em Juiz de Fora. É mestre em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora e Doutoranda da mesma instituição.

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